Concordo com os gregos que diziam em uma Grécia antiga de tragédias atuais: não importa o fim da história e sim a maneira como ela é contada. A audiência das tragédias gregas, geralmente, tinha conhecimento prévio de suas histórias , mas mesmo assim comparecia para ouvir, chorar e rir do seu contar catártico. Isabel Allende, escritora chilena, em seu livro “Paula”, afirma que nenhum escritor termina um livro, na verdade ele é vencido pelo cansaço. De fato, deve ser o cansaço que traz o fim do livro. Você, quantos finais de livros extraordinários já leu? Eu, que me lembre, só mesmo “Cem Anos de Solidão”, de Gabriel García Márquez. Mas não culpo meus queridos escritores, terminar um livro deve ser mesmo muito difícil, afinal é sempre difícil chegar ao fim, quem dirá escolher no final, o final mais adequado, ou mais original, ou mais correto, ou mais incorreto, ou mais feliz, ou mais triste, ou mais inesquecível. Terminar um livro é talvez morrer, porque terminar um livro é dar adeus a uma história que nasceu de si mesmo, é se despedir de si. Se o final então é uma conseqüência inevitável e exausta do contar, porque guardamos os finais de tantas histórias como segredos? O contar deveria ser mais vagarosamente deliciado, sem pressa do final, sem pressa da revelação do segredo.
Tudo isso para dizer que Dona Delmira, a senhora da foto acima, me contou uma história sem final, ou, ao menos, sem pressa pelo final. Ela contava e recontava, e sempre repetia que se fosse contar tudo ficaria ali horas e horas, pois são muitas as histórias pra contar. De sua janela, Dona Delmira me emprestava seus olhos para que o meu olhar estrangeiro pudesse adentrar em seu vilarejo Tatajuba, em Jericoacoara, Ceará. Narrava ela que, há 40 anos, Tatajuba fora soterrada pelas andanças de suas dunas. Seus moradores, por mais que tentassem, não conseguiam remover tanta areia, areia que se misturava a tudo, a comida e a sonhos. Dia a após dia, bravamente eles tiravam areia de suas casas como quem tira neve. As dunas incansáveis continuavam a andar, seu andar enfim fez com que os moradores se deslocassem para as proximidades, onde fundaram a Nova Tatajuba. E de lá eles continuavam ouvindo sua montanha encantada cheia de músicas, vozes e luzes audíveis e invisíveis. Encantada mesmo são as histórias de Delmira, histórias de uma Tatajuba soterrada, mas incapaz de encobrir tanta saudade, tantas histórias. Histórias sem pressa, e quiçá sem final, ao menos para seus moradores.
Quem for a “Jeri” não pode deixar de conhecer Nova Tatajuba e ouvir as histórias que Dona Delmira conta e recorda há onze anos!
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